De hippie a maior nome da moda mundial

Aos seus 50 anos, o ex-hippie uruguaio tem muitos motivos para comemorar a decisão tomada na década de 70, quando deixou a fazenda dos pais para "buscar novos horizontes". No melhor estilo da época, desembarcou no Brasil com muitos planos e nenhum dinheiro. Foi vender jóias de prata (que fazia em casa) na Praça General Osório, no Rio de Janeiro, onde montava sua barraquinha todo final de semana, e na Praça da República, em São Paulo, onde aparecia eventualmente. Nos outros dias, carregava seus produtos nas costas e visitava cabeleireiros, galerias de arte e todos os lugares onde pudessem existir boas clientes. Bom de papo, foi conhecendo as pessoas certas e ganhando freguesia. Hoje, o Victor Hugo tem duas fábricas no Rio de Janeiro, vinte lojas próprias e 24 licenciadas e mais de 2100 funcionário, declara um faturamento anual de 50 milhões de dólares ano.

"Quando cheguei ao Rio, artesanato era moda e eu fazia jóias caras. Meus clientes sempre foram artistas e grã-finos", lembra. "Eu vivia como os clientes, gastava muitíssimo e nunca sobrava dinheiro." O estilo incluía um lado globe-trotter, com viagens freqüentes a Ibiza, Saint-Tropez, Paris e Londres, onde ele garante que conseguia se sustentar vendendo jóias. Nessas andanças, aprendeu várias línguas – fala fluentemente italiano, francês e inglês, além do espanhol original e do português –, conheceu muita gente e ampliou o leque de clientes.

Conta que quando se preparava para uma dessas viagens notou que, no Brasil, não havia malas ou bolsas de boa qualidade. Pronto: a barraquinha mudou de ramo. A primeira bolsa Victor Hugo era uma espécie de baú com duas alças. Seguindo o mesmo conceito das jóias, passou a fazer bolsas exclusivas, artesanais e, lógico, caras – uma bolsinha de couro custava o equivalente a 300 dólares. A promoter carioca Anna Maria Tornaghi confirma esse detalhe. "A primeira bolsa que comprei dele foi em uma galeria de arte. Eu estava com uma amiga e lembro que a bolsa era bem cara, porque a minha amiga até sugeriu que comprássemos uma só para nós duas – naquela época recebíamos mesada, e a mesada era pequena", rememora.

Depois de vender de porta em porta, Victor Hugo passou a produzir pequenas coleções para lojas conhecidas, como Elle et Lui, Krishna e Via Veneto. Com a marca mais ou menos firmada, Victor Hugo aposentou a barraquinha, montou uma fabriqueta e abriu a primeira loja em Ipanema, em 1975. Daí para a frente, cresceu sem parar, sempre fincado no nicho dos produtos de luxo – o preço médio de uma bolsa Victor Hugo é 500 reais, podendo chegar a 1200 cobrados por um modelo de couro de avestruz. Enquanto os portos nacionais estavam fechados à importação, reinou sozinho, com bolsas notavelmente semelhantes às das grandes grifes internacionais – característica que ele mesmo reconhece. "Como eu era a única referência, não tinha nenhum problema minhas bolsas serem parecidas", diz. Mas ressalva: "Agora que estão chegando todas, tenho de fazer mais produtos personalizados". Nas prateleiras, porém, o que se vê ainda é muita inspiração, digamos, externa. Por que, então, alguém se dispõe a pagar caríssimo pelo VH (logo que lembra muito o LV, de Louis Vuitton)? Fidelidade, diz ele, e carteira recheada. "Quem pode comprar Victor Hugo não pensa em economizar".

A salvação está nas bolsas e congêneres. Responsáveis pelo nascimento de algumas das maiores grifes internacionais, como Louis Vuitton (com malas de viagem, em 1854), Gucci (sapatos, 1906), Prada (bolsas, 1913) e Fendi (casacos de pele e malas, 1925), quase um século depois os acessórios voltaram à passarela para reerguê-las. Impulsionadas pela fome de produtos de grife de mulheres com dinheiro para gastar, turbinadas pelos dólares de grandes grupos de investimento e rejuvenescidas pelo talento de jovens estilistas, as velhas senhoras sacudiram a poeira da decadência e viraram sinônimo do que há de mais chique e moderno. Por trás desse renascimento quase sempre há uma bolsa que mulheres do mundo inteiro precisam de-ses-pe-ra-da-men-te ter. O faturamento da italiana Gucci, de 500 milhões de dólares em 1995, dobrou para pouco mais de 1 bilhão de dólares em 1999 – 40% disso em artigos de couro. O da Prada, marca quase obscura transformada em ícone dos modernos a partir de uma simplíssima sacola de náilon preta, cresceu de 210 milhões de dólares em 1994 para 500 milhões de dólares em 1997.

Mais dramática foi a reviravolta da Fendi. Comandada por cinco irmãs, a empresa familiar estava a caminho de tornar-se obsoleta em matéria de estilo e superada no que concerne aos métodos administrativos. A salvação veio em 1997 na forma de uma bolsinha batizada de baguette. Sozinho, o modelo de alça curta, para carregar debaixo do braço como o pão francês que lhe dá o nome, vendeu 300.000 peças em dois anos, a um preço médio de 1100 dólares – mas que pode chegar a 8.000, dependendo da sofisticação do material. A grife acabou vendida por 485 milhões de dólares e a baguette correu o mundo. Até hoje "inspira" legiões de imitadores. Grandes nomes, inclusive – Gucci, Dior, Prada, todas têm sua versão da baguette. Isso é comum quando um modelo alcança sucesso excepcional. Uma das bolsas mais copiadas do mundo no momento é a bowling bag da Prada (do tipo da maleta que se usava para carregar bolas de boliche). Entre as muitas versões, há uma da orgulhosa concorrente Louis Vuitton, ela própria intensamente pirateada. Pois é, acontece até nas melhores famílias.

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