‘O marketing evangélico é agressivo’, diz primeiro padre cantor



O nome do padre Zezinho pode não ser mais tão familiar aos 128 milhões de católicos do Brasil, mas sua assinatura continua dominando o universo da música sacra. Autor de mais de 1700 canções e 90 livros, o José Fernandes de Oliveira, de 76 anos, é considerado o pioneiro do gênero no Brasil e mentor da grande maioria das estrelas do meio. Suas canções já foram regravadas pelos padres Marcelo Rossi, Fábio de Melo e Reginaldo Manzotti, além de ganharem versões nas vozes de Luan Santana, Zeca Baleiro e Roberto Carlos.

Apesar dos anos longe dos palcos devido à recuperação de um AVC, sofrido em 2012, a agenda do padre Zezinho continua lotada. Devido às mais de cinco décadas de experiência no trabalho com jovens, foi convidado para participar de um seminário no Vaticano em preparação para o próximo Sínodo dos Bispos, cujo tema será o diálogo entre a Igreja Católica e a juventude. Na última quarta-feira (11), ele esteve em Aparecida, onde participou de um show ao lado de padres e artistas católicos em homenagem aos 300 anos da imagem. No dia seguinte à apresentação, padre Zezinho sobre o cenário da música sacra no país, a concorrência com os evangélicos e o futuro da Igreja.

Segundo ele o limite entre ser sacerdote e ser uma celebridade é um assunto que todos os, padres cantores, precisamos resolver. "O Papa Francisco já deixou muito claro que não quer padres artistas. O padre tem que ter “cheiro” de ovelha, tem que andar misturado ao povo. Tanto que, nos meus shows, eu sempre descia junto à multidão e pedia que não me agarrassem. O povo sempre me respeitava. Agora, se o padre sobe no palco e depois some num carro cheio de guarda-costas e não fala com o povo, é um artista." diz padre Zezinho

Também foi abordado se a música católica está deixando a desejar com relação à evangélica "Há autores excelentes entre os evangélicos, mas a música católica continua muito boa. Eu, por exemplo, continuo compondo com o mesmo cuidado. Escrevo canções cheias de conceitos da psicologia e sociologia, que celebram símbolos conhecidos por toda a humanidade. Falo muito de pão, água, vinho, velas, luzes, ventre, colo. São letras que trazem reflexões profundas a um povo pobre, de maneira acessível. O que acontece é que os evangélicos são muito bons de marketing."

Um tema muito discutido é que a Igreja Católica está perdendo fieis para os evangélicos, porém o Padre Zezinho afirma"O marketing deles é muito agressivo. Basta ligar a televisão e ver as garantias que eles dão, os milagres que prometem. Nós católicos também presenciamos milagres, só que não fazemos propaganda disso e a multidão que vai a Aparecida está aí para provar. Só que eu não saio gritando por todos os cantos, nem expulso demônios em público, muito menos uso o palco para me exibir. Inclusive, mesmo na Igreja Católica, quando vejo alguém que se gaba desse poder, sugiro que o use nas UTIs de hospital. Os católicos tem o mérito de saber refletir. Para mim, a reflexão já é um grande milagre. Aliás, a ideia de o Brasil passar a ser um país evangélico não me assusta. Quem quiser ir embora, pode ir. Eu continuo tentando ser um bom padre católico."

Percebemos que o público jovem não frequenta a igreja católica com medo da doutrina proposta, porem o padre Zezinho diz "Os preceitos da Igreja existem há séculos e não serão jogados fora. A doutrina católica é boa, basta que a gente descubra a melhor forma de ensinar.". Porém entre os preceitos vistos como mais ultrapassados – como o sexo antes do casamento ou as relações homossexuais ele afirma que "existem formas de tratar estas questões sem ofender nem impor nada a ninguém. Certa vez, um casal de namorados veio conversar comigo, aflitos por não viver o mandamento da Igreja. Ao invés de lhes punir ou sugerir que parassem de ter relações sexuais, perguntei porque não consideravam a ideia de se casar, já que se gostavam tanto."

A Igreja Católica passa uma imagem de não dialogar porém segundo o Padre Zezinho "É uma imagem falsa. Todos os papas desde João XXIII abriram as portas da Igreja, cada um a seu modo. Eu mesmo sou um dos padres com origem no Concilio Vaticano II – e não somos poucos. Não tenho feito outra coisa senão deixar a esquerda, a direita e outras religiões falarem. Trabalhei com cardeais brilhantes que fizeram a mesma coisa. Os únicos que tem dificuldade de dialogar conosco são as novas igrejas que buscam adeptos. Quem acha que a Igreja Católica não dialoga é porque também está querendo se impor."

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